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Países separados e Unidos

novembro 11, 2013

ANGOLANIDADE

UM CONCEITO ECLÉCTICO








Nenhum povo do mundo é igual ao outro. Cada um tem à sua trajetória traçada ao longo do tempo. Nisto forjaram-se às identidades, que para Barbosa (2003:267)
      
 O conceito de identidade pressupõe uma corrente selectiva que não abrange completamente a  variedade e diversidade de uma determinada pessoa, sociedade ou nação.

Kola Jean-François ( 2005) não escondeu à dificuldade em discutir o conceito e, preferiu dividi-lo em múltiplas abordagens e, sob o ponto de vista de Alex Mucchieli, fragmentando-o em: l'approche psychologique;  sociologique; psycho-sociologique; anthropologique;  philosophique e por fim,  l'approche littérairet.

Ao  fim de largas páginas Kola não passa dos limites da noção de alteridade do conceito de identidade.  O "eu" individual e "outro". O "nosso" particular e "deles" sendo que, para várias abordagens, as particularidades prendem-se com os campos de estudo disciplinar.

Ainda assim, em certa ocasião Kola (p.40) reforça a ideia de Alex Mucchieli quando diz que

L’identité est un ensemble de significations (variables selon les auteurs d’une situation) apposées par des acteurs sur une réalité physique et subjective, plus ou moins floue de leurs mondes vécus ensemble constitué par un autre acteur. C’est donc un sens perçu donné par chaque acteur au sujet de lui-même ou d’autres acteurs.

A descoberta do si, não é uma tarefa desfazada do passado, antes procurará dialogar com às raízes para possuir o seu carácter. Por isso, Paul Ricouer[1] (1991: 139) afirma que é pela escala de uma vida inteira que o si procura a identidade[2].

A descoberta do si é uma tarefa que envolve pelo menos uma questão fundamental: quem sou?

Para o caso da angolanidade, a resposta obrigará, antes de tudo, a formulação de mais  duas questões: 

Quem fomos? e para onde vamos ou queremos ir?

A angolanidade é muitas vezes definida e enquadrada na linha ideológica da negritude, da africanidade que obviamente, lhe serviram de substrato para uma auto – definição/identificação.

Começou por ser um critério de nacionalidade, mais tarde de pertença à nação e de confirmação da sua existência. É um fenómeno social, cultural totalizante e normativo que se manifesta também na criação literária de Angola. (Santili, 2003; Mata, 2012; Venâncio, 1987)

A angolanidade assume um protagonismo decisivo no processo de formação da identidade nacional pois,

[…]começara por ser um critério de nacionalidade, passou a critério de pertença à nação e, portanto, de confirmação da sua existência. (p.58) […] esta foi pensada – e supõe-se que ainda o seja – para além das diferenças de natureza classista, rácica, étnica ou regional e foi propulsor de uma identidade concebida como resultado de mudanças originadas pelo poder colonial – porém, mudanças originadas no espaço urbano.[3] (p. 61)

Ainda assim, segundo Pepetela (1992: 99) a angolanidade é um conceito abstracto que ninguém sabe muito bem o que é, pelo que rebate:

No fundo não conseguimos até hoje teorizar, definir o que é isso de angolanidade. Isto embora esteja patente na obra dos escritores angolanos, claro. Creio que é um conceito que se vai procurar ainda durante muito tempo.

As diversas interpretações sobre o conceito de angolanidade tem demonstrado a sua instabilidade, mobilidade e evolução. Em cada época ela serviu para designar e particularizar as características da identidade de Angola.

Assim entre muitas possibildades, podemos falar em uma angolanidade sociológica; antropológica; literária; política e cultural. Cada uma será definida de acordo com o campo disciplinar do lexema que o junta.

Um dos autores actuais que mais se tem batido sobre essa questão é Luís Kandjimbo, (1997) para quem,  a angolanidade trata-se de uma categoria de expressão nuclear de manifestações culturais angolanas, encontrando-se por ela, recobertas as práticas literárias orais e escritas.

Sendo a angolidade um conceito polimórfico na sua natureza e interpretação, congrega um conjunto de manifestações que transcendem os limites de uma interpretação  baseada somente em conhecimentos diacrónico e sincrónico da história de Angola.

Na  abordagem deste écletico conceito, Luis Kandjimbo entende também, que a angolanidade

congloba não só os resultados das estratégias de enunciação literária em língua portuguesa, mas de igual modo o sistema semiótico da oralidade, onde imperam outros códigos, nomeadamente paralinguísticos, cinésicos, proxémicos, lúdicos, etc. Donde se escoram as preocupações epistemológicas em fornecer uma definição instrumental da literatura angolana[4].

O eclecticismo do conceito de angolanidade reside no facto de ser definida e entendida sob o ponto de vista diacrónico e sincrónio e em várias vertentes.

Assim, podemos falar em uma angolanidade pré-independência; histórica, sociológica, literária e política.


[1] Paul Ricouer (1991 )  O si-mesmo como um outro . Trad. Luci Moreira Cesar. Campinas: Papirus.
[2] Nesta proposição, o autor fala da mesmidade e da ipseidade e procura definir ambos conceitos. A identidade como mesmidade é o idem. É um conceito de relação. Não existe sozinha. Se – e somente se – vinculada no/ao tempo é que pode ser avaliada. A identidade como ipeseidade é individual e única. Apesar de as duas remeterem à semelhança, ainda que de maneiras diferentes, a ipseidade não é a mesmidade e vice-versa.  Só o tempo às distingue no seu dialogismo com o espaço; em que as mudanças ameaçam; o tempo apaga, mas nenhum dos dois desfaz o ipse do sujeito e  o que permanece são fragmentos de relações entre ocorrências a respeito de um mesmo sujeito.
Para o autor (1991:140)  a literatura é um vasto laboratório onde são testadas estimações, avaliações, julgamentos de aprovação e de condenação pelos quais a narrativa serve de propedêutica à ética. Assim a literatura – e a narrativa literária – são laboratórios, ou seja, corresponde a espaço para testes do si em relação ao outro e, por isso, enquanto espaço/ tempo para a constituição/construção da(s) identidade(s).
[3] Inocência Mata (2012:58-61) Ficção e história na literatura angolana. O caso de Pepetela. Edições Colibri. Lisboa
[4]Luís Kandjimbo (1997 ) Apologia de Kalitangi. Ensaio e Crítica Instituto Nacional do Livro e do Disco. Luanda, Angola.


BIBLIOGRAFIA 

FRANÇOIS, Jean Kola ( 2005) Identité et institution de la littérature en Côte d. Ivoire. Université de Limoges. Côte d. Ivoire.
MATA, Inocência ( 1992) Pelos Trilhos da Literatura Africana em Língua Portuguesa. Pontevedra - Braga, Cadernos do Povo / Ensaio.
MUCCHIELI, Alex (1986)  L.identité. Paris, PUF.
 KANDJIMBO,  Luís (1997 ) Apologia de Kalitangi. Ensaio e Crítica Instituto Nacional do Livro e do Disco. Luanda, Angola.
RICOUER, Paul (1991 )  O si-mesmo como um outro . Trad. Luci Moreira Cesar. Campinas: Papirus.
 
VENÂNCIO, José Carlos (2000) O Facto Africano, Elementos para uma Sociologia de África. Fundação Joaquim Nabuco