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novembro 18, 2012

Aprendizagem da Oralidade

Programa da 7ª classe: análise crítica

 

 

3.1 A oralidade


 A comunicação oral é inata ao ser humano. Ela é uma actividade intersubjectiva regida por padrões sociais, e desenvolve-se ao longo de toda a vida. 

Não obstante isto, a tradição escolar sempre privilegiou no seu programa de língua o ensino da escrita, e quando se tratava da oralidade, era meramente para exprimir pela voz o que se entendeu da análise e compreensão de um texto escrito.

Essa abordagem primária da oralidade foi ultrapassada muito recentemente com o avanço dos estudos sociolinguísticos (Daro, 2006:1), com a consideração de que ela deve ser entendida hoje como 
uma prática social interactiva para fins comunicativos que se  apresenta sob várias formas ou géneros textuais fundados na realidade sonora: ela vai desde uma realização mais informal a mais formal nos vários contextos de uso[1].

Como prática social a língua é maleável às situações contextuais de comunicação (Castilho, 1998:11), uma perspectiva que exige ao locutor a adequação discursiva oral a objectivos, públicos e outras variáveis interactivas.

Bakhtin também deu um valioso contributo a esta perspectiva ao considerar a prática discursiva oral como reflexo dos diversos géneros discursivos presentes na sociedade com a sugestão de que o seu ensino deva ser feito em ambiente intra e extra-escolar.

Nós também alinhamos nesta perspectiva, por promover a formação de potenciais comunicadores, cônscios das implicações que o seu discurso acarreta.      

Compreendemos, igualmente, que ensinar aos alunos as regras a partir de situações reais far-lhes-á possuir uma consciência implícita ou explícita da oralidade, factor essencial para a aprendizagem, domínio consciente e reflexivo de uma Língua Segunda (LS).

Do que acima fica explícito, deduz-se que ensinar a oralidade em LS sugere hoje levar o aluno a produzir enunciados orais em contextos socioculturais diversificados com auxílio a recursos cenestésicos, prosódicos e outros, de modo a alcançar a competência comunicativa[2] oral.                                                                        

Levar o aluno a conhecer o papel, o lugar e o grau de relevância que exerce a oralidade como uma prática social torna ainda mais o seu ensino significativo e pragmático, uma visão partilhada igualmente por Stephen Krashen na sua comprehensible input hypothesis, em que sustenta que a assimilação de línguas segundas ocorre em situações reais de comunicação, colocando ênfase no contexto, para ligar a escola ao mundo, como meio de promover uma aprendizagem holística.

Em Angola, o PPLS da 7ª classe, coaduna-se teoricamente com este pressuposto e presta-se a levar o aluno a compreender enunciados orais [...] através da informação captada[3] fora e dentro do ambiente escolar em contextos reais e diversificados de comunicação oral.

Para o alcance desta meta, o mesmo apresenta cinco tipologias textuais com objectivos, metodologias, estratégias e dá alguns exemplos para a sua execução na aula.

Veremos como é feita essa articulação do Programa, reforçando antes a convicção da presença dos conhecimentos prévios nos discentes no domínio da oralidade, como é óbvio, adquiridos nas classes anteriores, e ainda o referente, dado que o português de Angola se realiza sob uma base oral muito forte, sob uma influência das línguas maternas Bantu, na sua maioria ainda sem materiais de descrição e análise e que conserva a tradição oral por séculos.

Partimos assim para a abordagem das propostas do Programa, conhecedores desse potencial, mesclado com as inúmeras interferências nascida da mixagem entre o português de Portugal e as línguas locais, duelo que dita à partida a complexidade do ensino da oralidade em Angola.

Ora observemos e analisemos então o quadro a seguir baseado no PPLS da 7ª classe.

Quadro 2: A oralidade no PPLS 7ª classe Reforma Educativa Angola


Tipo de texto

Objectivo

Metodologia

Estratégia

Exemplo

Narrativo
Consolidar a integração do texto narrativo nos domínios do oral.

Participativa
Expositiva
- Resumo oral
- Dramatização
- Relatos pessoais

O quê?; Como?;  Porquê?


Descritivo

Distinguir e integrar a descrição nas várias situações de comunicação orais.

Ibidem

- Descrição oral de ambientes e espaços físicos e pessoas.

Sala de aula, recreio, quarto de dormir, casa, etc.

Injuntivo


  Não definido. 

      ---------

       ---------

    ---------

Informativo

Consolidar a integração do texto informativo no domínio do oral.
Participativa
Expositiva

Não sugerida 

Não sugerido

Poético

Recitar textos memorizados.

 Ibidem
- Declamação e recitais.
- Debate sobre o significado das mensagens das poesias.

Escolher os poetas que serão recitados, lidos ou dramatizados.
 
 Da análise deste quadro notamos a preocupação do Programa de Português Lingua Segunda (PPLS) em proporcionar aos alunos da 7ª classe um ensino e aprendizagem da oralidade a partir de textos narrativos, descritivos, informativos e poéticos de forma significativa e pragmática.

Assim, através do método participativo, os discentes realizam actividades pedagógicas orais como: resumos, relatos, dramatização, debates, conversas informais, entre outras. Tal processo é um continuum didáctico operacionalizado em conjunto com o método expositivo usado para ditar a matéria.

Porém, verificamos que o PPLS apresenta poucos exercícios destas operações didácticas, o que pode dificultar o trabalho ao professor novo e inexperiente por um lado, e facilitar a criatividade e liberdade do professor experiente e mais dotado por outro.

O PPLS não trabalha a oralidade no texto injuntivo e não aponta nenhuma estratégia e exemplo no texto informativo.

Essas omissões injustificadas limitam e fragilizam o papel sociointeractivo da oralidade e a inserção sociolinguística e cultural do aluno da 7ª classe, ainda em idade adolescente, pois aprender a fazer um pedido, a dar instruções, a desculpar-se, a dar conselhos, a cumprir e a dar ordens, e outras finalidades do texto injuntivo, pensamos ser fundamental na educação moral, cívica e comunicativa, enfim, holística, para o aluno ainda em tenra idade.

Da análise constatamos ainda que o PPLS em nenhum momento se refere a interacção interdisciplinar no processo de ensino da oralidade, o que podemos considerar uma falta, porque os alunos não só usam a fala em questões de língua portuguesa como disciplina, mas realizam igualmente outras tarefas que os obrigam a usar a oralidade, como operações matemáticas, questões do meio ambiente, da química, da física, entre outras hipóteses, e seguramente necessitarão aprender a usar palavras adequadas a esses contextos de comunicação.

O uso da didáctica preventiva, num primeiro momento, e correctiva noutro, resultaria em vantagens na aprendizagem da oralidade, face às inúmeras interferências das línguas indígenas no português falado em Angola, o que não é aludido no PPLS da 7ªclasse.

Contrastar os dois sistemas linguísticos também é outro recurso didáctico a ter em conta, partindo sempre dos conhecimentos prévios e explícitos dos alunos na língua materna, fazendo um transfer quando possível para o Português.

Nos casos em que haja mesmo a inexistência do som ou a adição de um outro som, como acontece no caso da vogal epentética colocada entre duas consoantes, à guisa de exemplo: [peneu]; [pigimeu]; [ritimu], sugerimos uma correcção numa base colaborativa.

Sobre esse pormenor, não avançamos com mais exemplos do género pela essência do nosso Trabalho, mas recomendamos a consulta de autores que tratam profundamente o assunto: Cabral, V. (2005); Endrushat, A. (1990); Fernandes, J; Zavoni, N. (2002); Gartner, E. (1989); Marques, I. G. (1990); Mendes, B.C. (1985); Mingas, A. (1998); Mira, M.H. (2002) entre outros.

Pensamos portanto que urge assim melhorar a imbricação entre estratégias de aprendizagem, de comunicação e de produção na aquisição de LS no campo da oralidade na 7ª classe.


[1] MARCUSCHI, L.A. (2001: 21) Gêneros textuais e ensino. Lacena, Rio de Janeiro.

[2] É o conhecimento abstracto subjacente e a habilidade de uso não só de regras gramaticais (explícitas ou implícitas) como também de regras contextuais ou pragmáticas (explícitas ou implícitas) na criação de discurso apropriado, coeso e coerente. Permite ao indivíduo agir utilizando especificamente meios linguísticos e compreende diferentes componentes: linguística, sociolinguística e pragmática. Cada uma destas componentes é postulada de forma a compreender o conhecimento declarativo, as capacidades e a competência de realização. (Almeida Filho: 1999; Hymes:1979; QECR, 2001).

[3] INIDE (2005:6-32) Programa de Língua Portuguesa do 1º Ciclo do Ensino Secundário. Luanda.



Bibliografia


 CASTILHO, A. T. de. (1998) A Língua Falada no Ensino do Português. Editora Contexto, São Paulo.

DAROS, Sônia C.P (2006) Oralidade: Uma Perspectiva de Ensino. (Dissertação de Mestrado Universidade de São Paulo) Piracicaba, São Paulo.

FERNANDES, João; NTONDO, Zavoni. (2002) Angola: Povos e Línguas. Editorial Nzila, Luanda.

FILHO, Almeida. (1999) A Abordagem Orientadora da Ação do Professor. Pontes, Campinas.

INIDE  - (2005) Programa de Língua Portuguesa do Iº Ciclo do Ensino Secundário, Reforma Educativa. Luanda, Angola.  

 _______ (2005) Manual de Apoio ao Sistema de Avaliação das Aprendizagens para o IIº Ciclo do Ensino Secundário Geral da Reforma Educativa. Luanda, Angola

MARCUSCHI, L.A. (2001) Gêneros Textuais e Ensino. Lucena, Rio de Janeiro.

MARQUES, I. Guerra. (1990) Algumas Considerações sobre a Problemática Linguística em Angola. Instituto de Cultura e Língua Portuguesa. Lisboa.

MENDES, Beatriz Correia. (1985) Contributo para o Estudo da Língua Portuguesa em Angola. Instituto de Linguística da Faculdade de Letras de Lisboa. Lisboa.

MESQUITA, Helena (2003) Manual do Professor, Língua Portuguesa 7.ª Classe. Texto Editores. Luanda.

MINGAS, Amélia A. (1998). Interferência do Kimbundu no Português Falado em Luanda. Porto: Campo das Letras. 2002. Ensino da Língua Portuguesa no Contexto Angola. In Mira Mateus. Colibri, Lisboa.

MIRA M. M Helena (ed.). (2002) Uma Política de Língua para o Português. Colibri. Lisboa.