Como ensiná- la melhor?
O conhecimento, domínio e uso da escrita é uma necessidade indispensável na sociedade letrada dos nossos dias. Não só por ser um meio de expressão estável, que nos dá acesso ao conhecimento milenar da sociedade adquirido através do tempo, mas também por ser considerada uma necessidade básica a ser satisfeita, logo depois de a criança aprender a andar e falar. as crianças não ficam a espera de ter seis anos e uma professora a frente para começarem a reflectir sobre problemas exactamente complexos, e nada impede que uma criança que cresce numa cultura onde a escrita existe reflicta também a cerca desse tipo particular de marcas. (Smith, 2003:22)
O conhecimento, domínio e uso da escrita é uma necessidade indispensável na sociedade letrada dos nossos dias. Não só por ser um meio de expressão estável, que nos dá acesso ao conhecimento milenar da sociedade adquirido através do tempo, mas também por ser considerada uma necessidade básica a ser satisfeita, logo depois de a criança aprender a andar e falar. as crianças não ficam a espera de ter seis anos e uma professora a frente para começarem a reflectir sobre problemas exactamente complexos, e nada impede que uma criança que cresce numa cultura onde a escrita existe reflicta também a cerca desse tipo particular de marcas. (Smith, 2003:22)
A par disto podemos
afirmar tal como David Diringer (1968:15) que sem a escrita, a cultura,
definida como uma «inteligência transmissível», não existiria. A lei, a
religião, o comércio, a poesia, a filosofia, e a história e todas aquelas
actividades que dependem de um certo grau de permanência e transmissão seriam
incalculavelmente restritas.
A dimensão e importância da escrita obriga o seu ensino-aprendizagem em várias
dimensões a constituir: uma actividade cognitiva; uma apropriação
continuada de uma forma particular da linguagem e do seu uso; como um processo
comunicativo, e por fim, como uma actividade
contextualizada e intencional.
A
escrita enquanto acto social deve ser vista também como uma actividade de
resolução de problemas (Amor, 2006: 93) e nisto a escola deve assumir o
seu papel explícita ou implicitamente para que o
aluno aprenda a escrever.
O ensino-aprendizagem da escrita exige a definição de
metodologias e estratégias, cujo fim seja a proficiência neste campo, entendida
como a capacidade de produção de textos socialmente úteis dentro das balizas
linguísticas e extra linguísticas.
Para
tal deve-se prestar maior atenção ao processo de aprendizagem do que aos
produtos que os alunos realizam, como advogam
também os paradigmas actuais de ensino.
Isto
não significa que o produto não seja importante, porém a intervenção do
professor deverá centrar-se no processo, por estar
nele a fonte e a base segura para mudança que vá de acordo com o registo
padrão como advoga Stroud (1997) na sua teoria geral de Língua Segunda.
Neste
sentido, o desafio para Angola é duplo: por um lado deve adequar a sua escrita
aos padrões da língua portuguesa de Portugal e, por outro, não deve abdicar das
circunstâncias locais, neste caso as mais importantes para o ensino da escrita.
Nesta complexidade, a experiência acumulada de docência confirmou os escritos
da situação complexa sociolinguística e as múltiplas implicações no ensino da
escrita: tendência em escrever conforme se fala; o desconhecimento das regras
ortográficas e de sintaxe; a não correspondência, em alguns casos, entre o
fonema e o grafema, a falta de incentivo pedagógico à promoção da escrita são,
dentre muitos, os factores que impelem e convocam para um trabalho profundo e
aturado, no campo do ensino da escrita em Angola.
Ultrapassar
esses e outros obstáculos é o que se propõem as autoridades educativas de
Angola com o projecto da 2ª Reforma.
Para
a 7ª classe, o PPLS da 2ª Reforma, procura levar
o aluno a aprofundar a prática da escrita, a partir de intenções variadas
(p.6) e para tal aposta na metodologia participativa e expositiva. Observemos o
quadro abaixo:
Quadro 4: A escrita no PPLS 7ª classe
Reforma Educativa Angola
Tipo de texto
|
Objectivo
|
Metodologia
|
Estratégia
|
Exemplo
|
Narrativo
|
Aprofundar a prática da escrita a partir de intenções
variadas.
|
Expositiva
Participativa
|
- Aplicação correcta dos sinais de pontuação.
- Construção de frases simples e complexas
|
Não sugerido
|
Descritivo
|
Ibidem
|
Ibidem
|
- Descrição escrita
de ambientes, espaços físicos e pessoas.
- Redacção em grupo de diferentes textos descritivos.
- Redacção descritiva sobre o retrato psicológico de uma
personagem.
|
- Sala de aula, recreio, quarto de dormir, casa, etc.
- Ementa imaginária de um restaurante; rótulo de um produto
- Personagem modelo e exemplar para os alunos.
|
Injuntivo
|
Ibidem
|
Ibidem
|
- Redacção de textos injuntivos.
|
- Regras dentro da sala de aulas; regulamento da escola; um
produto ou serviço a partir de uma imagem
|
Informativo
|
Ibidem
|
Ibidem
|
- Redacção de pequenas notícias sobre a escola;
cartas à colegas e professores, avisos e circulares.
|
- O quê? ; Quando? ; Onde? ; Como?,
Porquê?
|
Poético
|
Ibidem
|
Ibidem
|
- Criação de pequenas rimas a partir de
palavras dadas pelo professor.
|
Não sugerido
|
A ideia segundo a qual os alunos
da 7ª classe já possuem as noções básicas de escrita, sustenta, como se
depreende, a metodologia participativa adoptada no PPLS em que o professor
incentiva os alunos a construírem o seu próprio conhecimento autonomamente, com
realização de redacção de diversos tipos de textos, não apenas com intuito
formativo mas também socialmente útil.
A metodologia expositiva
sugerida para o ensino da escrita não vem explicitamente delineada como será
usada, pelo que esperamos não servir apenas para o ditado de matéria mas, e
sobretudo, para exercícios dialógicos, em que
os alunos participam dos vários momentos da aula como:
a explicitação de suas ideias; problematização; construção de argumentos e
sistematização.
Do quadro, aferimos ademais que
as estratégias sugeridas para o aprofundamento das técnicas de escrita, se assemelham
mais a objectivos secundários, do que propriamente à operacionalização do
método. Assim, o que há a fazer está muito
claro, mas o como fazer não é evidente. Isto
pode dificultar o processo e os resultados da aprendizagem, pois os
procedimentos metodológicos devem ser equiparados ao momento fundamental da
transmissão e aquisição das novas aprendizagens. Situação semelhante
verifica-se nos exemplos: são escassos, pobres e pouco diversificados, isto
para além das omissões na tipologia narrativa e poética.
A exemplificação
e a operacionalização das estratégias demonstram o domínio do conteúdo pelos
autores do Programa. Quando omissas, depreende-se que não o sabem, ou abrem
espaços para intervenção criativa crítica do docente, o que raramente acontece.
O mais evidente é saltar o conteúdo, ou ministrá-lo dentro das limitações do
Programa e como é óbvio, as consequências são desastrosas: alunos em classes avançadas com dificuldades básicas de escrita e
professores com longos anos de docência mas com pouco domínio do conteúdo e
acomodados ao básico.
Na tipologia poética, nota-se
ausência de uma estratégia para a produção deste tipo de texto, pois criar
rimas, como se pede no PPLS, pode ser um bom início para o ensino da
versificação, mas não para aprofundar a escrita de um texto poético.
Sugerimos nesse caso que se parta da microestrutura textual para a macro,
de modo a que se faça uma aprendizagem gradual e evolutiva, do simples ao
complexo, como por exemplo partindo de textos não poéticos conhecidos e fazer
um estudo comparativo: estrutura, conteúdo e forma.
Para isso, as estratégias
metacognitivas deviam ser mais, e melhor exploradas, como por exemplo pôr os
alunos a escrever um texto narrativo e transformá-lo ou estudá-lo em comparação
com um texto poético. Dessa iniciativa, detectam-se as diferenças
intertextuais, e parte-se assim para a metodologia construtiva.
Para além disto, nota-se a
inexistência do apelo às etapas de uma escrita orientada segundo padrões
básicos como ensinar o aluno metodicamente:
a) a saber planear a escrita; b) a realizar escolhas adequadas quanto ao
vocabulário e à gramática e c) a adquirir capacidades de rever e reelaborar a
própria escrita, segundo critérios adequados aos objectivos, ao destinatário e
ao contexto de circulação do próprio texto. Outrossim as
estratégias preventivas e correctivas do “erro” estão omissas no PPLS.
Esqueceu-se por completo a questão das interferências das línguas locais no
português escrito em Angola.
Orientar a escrita é levar o
aluno, neste caso autor do texto, a pensar na pertinência dos dados com que
lida, na coerência, na correcção gramatical, na propriedade vocabular – exigências
já possíveis neste nível de escolaridade.
Para tanto, necessário se torna
propiciar condições de aprendizagem adequadas. Isto obriga à partida a
mobilização de meios didácticos e de estratégias adaptadas ao desenvolvimento
desta competência fundamental. Por isso, é importante que o professor
permanentemente questione os seus materiais e os seus métodos, caminhando para
uma integração entre o processo de ensino-aprendizagem da escrita e a eficiência
desta.
Portanto, o respeito pelas sugestões
metodológicas apresentadas pelo PPLS é importante, mas enriquecê-las é muito
mais gratificante, para um professor que preze o profissionalismo, auto
superação e espírito crítico. A escrita é mais rigorosa do que a fala por
exigir conhecimentos compósitos: podem “admitir-se” erros de pronúncia, mas de
letra/escrita não, e para o caso de Angola, é fundamental, claro,
salvaguardando as devidas objecções.
Bibliografia
AMOR,
Emília. (2006) Didáctica do Português,
Fundamentos e Metodologia. Texto editora, 6ª Edição, Lisboa.
BARBEIRO, L. F. (1999) Os Alunos e a Expressão Escrita:
Consciência Metalinguística e a Expressão. Fundação Calouste
Gulbenkian. Lisboa.
___________ (2003) Escrita:
Construir a Aprendizagem. Universidade do Minho, Braga.
BARROS, Agnela. (2002) A
Situação do Português em Angola. In Uma Política de Língua para o Português, ed. Maria Helena Mira
Mateus. Edições Colibri, Lisboa.
DIRINGER,
David. (1968) A Escrita.
Editorial Verbo, Lisboa.
DUARTE, I. M. (1994) O Oral no Escrito: Abordagem Pedagógica.
In Fonseca, F. I. (org.).
Pedagogia da Escrita.
Perspectivas. Porto, Porto Editora.